Todos os anos são iguais num certo sentido: pessoas falecem, quer sejam familiares nossos ou personalidades do mundo.
O ano de 2024 se destacou pela morte de Silvio Santos aos 93 anos.
A internet demonstrou grande comoção por várias semanas.
Trechos memoráveis do apresentador, comentários em texto sobre sua importância e diversas declarações em vídeo de colegas e admiradores.
Na mesma linha, em outubro, um cantor britânico faleceu de forma trágica na Argentina e não demorou para que fãs locais surgissem em vigília para prestar homenagens em frente ao local de sua morte.
Alguém pode achar que manifestações como essas são exageradas e em vão. Se medíssemos o valor delas por sua capacidade de reverter uma ocorrência, nenhuma serviria, de fato, afinal, nada nem ninguém pode algo diante da inevitabilidade da morte.
Mas as expressões de pesar pela perda de alguém valem pelo sofrimento do vivente e, psicologicamente falando, pelos ajustes subjetivos que são fundamentais para a experiência de um luto.
Sou muito simpático às manifestações coletivas. São fenômenos antigos, mas que foram muito ampliados com a internet, que torna quase instantânea a veiculação de notícias e amplia a variedade e o alcance de demonstrações de sentimento.
Meu interesse nesses eventos é tão somente porque lidamos muito mal com a morte, e em grande medida, essa dificuldade representa uma negação deliberada de entrar em contato com as emoções normais quando há o rompimento de um laço.
Me agradam as comoções públicas pois elas fazem um curioso movimento distinto do que se observa no sofrimento de luto mais privado e individual.
Essas manifestações em massa promovem uma permissão para expressão de sentimentos comuns e criam, na rua ou nas redes sociais, um espaço seguro para a partilha desses afetos.
Por outro lado, nos falecimentos privados, principalmente depois do tradicional ritual de sepultamento, o que se vê é uma força que vai na direção contrária à expressão da dor.
O sofrimento passa a ser insistentemente ocultado ou impedido, deixando de ser praticado de forma compartilhada, mesmo dentro de um ambiente familiar que está sob o efeito de uma mesma perda.
Um terrível senso comum insiste em sugerir que o melhor que se faz é esquecer, uma vez que lembrar da pessoa perdida faria mal e que não se deve chorar, pois isso demonstraria fraqueza.
Dessa forma, excluímos uns dos outros a possibilidade de identificarmos e expressarmos uma tristeza real.
Talvez façamos isso sem más intenções: desejamos muito fortemente ao nosso semelhante que fique bem e que fique logo, mesmo que fingindo, como um teatro absurdo de uma ditadura da felicidade.
Por isso, desejo que, no momento de uma despedida, os fãs apaixonados encontrem apoio mútuo e que, conectando-se com suas emoções verdadeiras, possam nos ensinar que um enlutamento é melhor vivido a partir de lembranças, sem pressa e sem pressão.
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